sociedade mercantil por uma Sociedade que exalta a Vida.
O primeiro território a libertar é o nosso próprio corpo. Desde há
séculos que a escolha dos Homens para se oporem a uma irreprimível
aspiração à felicidade não provém de qualquer fatalidade divina ou natural.
A tendência para servir o que nos mata foi ancorada em nós por um
conjunto de mecanismos que comandam o ser vivo, assestando-lhe um
sistema de sobrevivência fundado na exploração do Homem e da Natureza.
O ódio e o desprezo que o homem alimenta, tantas e tantas vezes,
para com ele próprio e para com os seus semelhantes, revelam quanto a
inumanidade é o verdadeiro mal-estar da nossa civilização. As nossas
sociedades estão doentes da barbárie que paga os interesses da opulência
financeira
.
É preciso repeti-lo até que evidência nos entre nos olhos adentro: a
nossa única riqueza é a VIDA, um Vida continuamente afinada pelo
progresso da sensibilidade e da inteligência humana. Ela é-nos dada sem
reservas, sem contrapartidas. Não temos de a sacrificar, nem de a
reembolsar pelo preço corrente do infortúnio. O nosso combate já não
consiste em como sobreviver numa Sociedade de predadores, mas em
como viver por entre Sêres vivos.
obrigações e das contrariedades transforma rapidamente em reflexo de
morte.Daí que a radicalidade de Maio de 68 assenta essencialmente na
recusa do “Homem Economizado” e na consciência de que é possivel
outra vida, outra sociedade, outro Mundo. Ela revelou que, abandonando a
escravatura do trabalho, surgia e erguia-se o “Homem do Desejo”, o
homem do grande desejo de vida. Ela trouxe à luz o conflito que urdirá
doravante todos os outros, a Inssurreição da Sociedade que exalta a
Vida contra a Sociedade Mercantil.
O ser humano não é nem uma presa nem um predador.
Assegurar a primazia da Vida sobre a economia é opor um «Não» firme e
definitivo a todas as formas predatórias, aprendendo a viver em vez de
aprender a matar, reprimir e explorar.
Nada é mais importante do que nos precavermos, e assim as
crianças, contra a manipulação dos seres vivos pela economia. É bom
insistir sobre a importância de um ensino que quebre o ciclo vicioso do
recalcamento e do extravasamento dos instintos reprimidos, da tirânia e do
laxismo, do mérito e do desmérito, do desperzo por si e pelos outros. A
verdadeira segurança da existência começa onde acaba a lei do mais forte e
do mais esperto.
Queremos criar um estilo de vida que priviligie em todas as
idades os jogos de aprendizagem, a criatividade, a emulação, a
curiosidade, a imaginação, a paixão pela descoberta, a abertura para
consigo e para com os outros, o despertar do corpo enquanto território de
prazer, a invenção do maravilhoso, passando desta forma a certidão de
óbito ao fetichismo do dinheiro, ao trabalho, à cupidez, à ganância pelo
poder, aos arranjinhos, à manipulação/competição, à concorrência, à
agressividade, ao entrincheiramento do carácter, à ostentação, à exclusão, à
culpabilidade, ao sacrificio, à dependência, ao clientelismo, ao gregarismo,
à identificação a um clã ou a uma imagem de marca.
Em Psicologia de Massas do fascismo,Wilhelm Reich
mostrou-nos a que ponto, ao bloquear as pulsões do corpo e ao impedir o
seu reconhecimento, a carapaça do carácter provocava um extravasamento
destruidor, uma peste emocional, cujas devastações se exercem em toda a
parte onde as descriminações religiosas e ideológicas, lhes proporcionarem
a presa.
O que leva as multidões abandonadas ao ressentimento
de uma existência sem alegria a aderir aos demagogos mais grotescos da
xenofobia e do proteccionismo é o facto de eles terem o bom senso de
macaquear, sem cosmética e com o descaramento do cinismo, a conduta
que a maioria dos politicos e dos responsáveis sindicais se esforçam por
dissimular ou mascarar sob os protestos humanistas, prontos que estão a
ser eleitos e se arrogarem a um poder, encorajar o clientelismo, apostar no
medo e no desalento e enaltecer as mais ignobéis reacções ditadas pelo
desejo ressabiado, pela cobiça, pela vingança e pelo ódio.
Da estrema-esquerda à extrema direita, os tribunos e os
tecnocratas da politica especializada rebatem a mesma matilha uivante
com o mesmo desprezo pela Vida que trazem dentro deles e que reprimem.
E quando dos mais néscios se pretende embebido de generosidade, esta é
logo desmentida oela sua atitude empertigada, pela sua rigidez, pela sua
inépsia, não direi a desfrutar a vida, mas a lutar pela propagação da
apetência pela felicidade individual que engendre uma felicidade colectiva
O que o sistema das negociatas mais teme é o Homem que se descobre
Humano e deseja fazer do usufruto de si mesmo o fundamento da sua
existência.
Os oprimidos sempre foram venvidos pelas armas que
ofereciam os opressores. O reino da cupidez e da ganância pelo poder, do
desespero existêncial, do ódio, do ressentimento, nada tem a temer de
insurrectos permeáveis aos vírus que ele enxameia.
Não colocaremos a comunidade ao serviço do individuo
se não se emanar de cada um dos seus membros uma vontade de
redercobrir o seu corpo, emancipando-o e fazendo dele um local de prazer
criativo.
Todos os horrores espalhados pelo mundo nascem de
um corpo arrancado ao desejo de viver por uma economia que o explora e
desvirtua. Claro que o facto da reconciliação de cada um com o seu corpo,
de previligiar o espaço e o tempo de desejo, só por si não quebram o jugo
da sociedade mercantil. Em compensação, digo que sem a consciência e o
desejo de uma felicidade individual, à qual cada um aspira, enquanto, ao
mesmo tempo, a recusa, não haverá felicidade colectiva, pois o mundo
continuará a exprimir o que subsiste em nós de mais inumano.Não é
permanecendo tolhido pelos mecanismos que a economia impõe aos
nossos comportamentos que oporemos o paciente ordenamento do vivente
ao caos e ao absurdo da Sociedade Mercantil.
O ser humano não é anjo nem besta, acoplados desde
há séculos para percorrer as vias da apropriação e do espírito predador
através das fronteiras indistintas de uma ética versátil. Acabar com o corpo
separado dos seus impulsos vitais e votado a extravasar-se na violência
suicida significa aprender a aceitar as pulsões animais desde a mais tenra
idade, não para as saciar, mas para as afinar e humanizar.
Reforçar em toda a parte a vontade de viver e
apostar na sua violência em vez de apostar do reflexo da morte, tal é o
critério e a garantia de um verdadeiro progresso humano. A perspectiva
agressiva não faz mais que avivar as feridas da sensibilidade, de onde
escorrem a barbárie e o cortejo macabro das dores suportadas e infligidas.
Não se trata de proibir o que nos proíbe de viver, trata-se de fortificar o
potencial de vida que existe em nós, de restaurar essa energia pela vida que
a civilização do ter corrompeu durante milénios.
Para fazer a felicidade uma prática quotidiana,
precisamos menos audácia do que de uma irreprimivel confiança nas
nossas próprias riquezas. O criador que dorme em cada um de nós aspira
secretamente a libertar-se da opinião, veiculada de geração em geração
pelas religiões e pelas ideologias, segundo a qual o homem é uma criatura
débil, incapaz de empreeder e apoiar seja o que for que não a torne mais
ainda mais miserável.
Aferroada na quotidiana maldição com que a
subjuga a economia dominante, a felicidade é certamente o pendor mais
natural e, por conseguinte, o mais fácil de reinvidicar e de perfazer, mas
oferece-nos o privilégio de nunca matar. A sua obstinação em recuar
apenas quando é preciso encontra um melhor apoio, desenha as linhas de
uma força irreprimivel e fortifica a própria violência de uma VIDA que,
uma vez dedicada à sua própria criação, alcança uma tal paixão, que desfaz
o laço da morte e abandona os poderes de destruição à sua dissolução
espontânea.
Demonstrando até que ponto detinha o segredo de
salvaguardar o fermento da vida a renascer para além da glaciação dos
séculos, quando perguntaram a Étienne de La Boétie:« Devemos armar-nos
para abater o tirano?», este forneceu aos seus comtemporâneos uma
resposta à qual eles não podiam subscrever sem a aplicar
imediatamente:«De forma alguma. Não quero que o empurrem ou abanem.
Quero, apenas, que o deixem de apoiar! Então vê-lo-eis, como um grande
colosso a quem retiraram o pedestal, cair e quebrar-se, arrastando o seu
prõprio peso.»
F I M